– por Soraya Martins –
não
serei
a
crítica
de
um
mundo
caduku
não vou mais lavar pratos de Curitiba a Belo Horizonte que eu chamo carinhosa e odiosamente tudo junto dentro de mim de Texas território luscofusco aridez vim pensando esse título do poema de Cristine Sobral pausa para a escala em Campinas eessa frase é presença obsidiante em mim esse poema que tanto fez sentindo para mim lá na época da graduação quando ainda como hoje estava construindo minha formação em várias matizes de conhecimento desde as mais escuras até as mais pálidas querendo e me construindo atriz crítica pesquisadora de teatro não vou mais lavar pratos assim depois de 9 anos da primeira leitura vindo de dois grandes festivais de teatro mas o que é ser grande Mostra Internacional de Teatro e Festival de Curitiba não significava mais para mim querer travessas de prata e cozinha de luxo passei dessa fase entendi que minha existência não é apertadinha não eu quero joias de ouro legítimas quero a redistribuição das violências bem Jota Mombaça e do poder como
substantivo&verbo
o atravessamento que o Festival de Curitiba fez em mim vai mas muito muito para além das peças que vi vai para além do próprio festival imbrica-se no universo sócio-cultural da sociedade que o engendra exigindo para sua leitura crítica expansão uma volição e interpretação uma reflexão também ela dialógica e intersemiótica própria do teatro própria da crítica teatral não quero falar de Outros Cabaré Transperipatético Uma Frase para mim mãe Isto é um negro Navalha na Carne homenagem a Tôniz Carreiro Navalha na Carne Negra O quadro de todos juntos Projeto Maravilhas
não
&
não é por que não tenho nada a dizer sobre esses espetáculos tenho muito eles transbordam em mim mas hoje quero falar de uma personagem que melhor me representa eu primeira pessoa do singular do singular ao coletivo e vice versa eu crítica corpo da negrura em territórios áridos texanos texas em expansão vista dentro de um delírio da branquitude no lugar reducionista da representatividade sim a representatividade é importante linda mas não pode ser tratada como um fim em si mesma ela é um meio
tra
ve
s
sia
ela como configurações de experiências que ensejam novos modos de sentir e induzem a novas formas da subjetividade política e efetividade do pensamento disso eu quero fazer parte nisso quero colocar meu corpo em jogo é esse poder substantivo & verbo que eu quero disputar quero ser protagonista não vou mais lavar pratos não serei a crítica de uma representexistência no lugar mais vazio não darei os suspiros ao sistema não distribuirei as falácias da facilidade ou as cartas epistemicidas não serei a crítica de um mundo caduku representante dos corpos outros que vai amenizar as contradições ou costurar com o próprio corpo e isso dói as lacunas de modos de pensar e fazer arte que ainda se pautam no lugar de arredar pouco ou nada o pé dos privilégios de não se radicalizar na partilha do sensível pensando em partilha como Rancière que diz do comum partilhado e das partes exclusivas eu acrescentaria das singularidades não como desigualdade mas em diferença a nervura da diferença a partilha de espaços tempos poderes desejos responsabilidades que determina a maneira como um comum se presta à participação e como uns e outros tomam parte nessa partilha é preciso dizer estando no CEFET-MG como professora no doutorado em uma instituição elitista por excelência no Fit-BH em Curitiba na MIT-sp no Fiac no Fitei ou em qualquer outro espaço privilegiado das práticas de ensino e de estéticas estando e habitando um mundo que nega a minha singularidade que o meu corpo estando nesses espaços não dá como coloca Tatiana Nascimento do Santos no texto Não sou sua preta de estimação alforria do racismo e nem tampouco desconstrói as opressões que as pessoas instituições festivais brancos reproduzem a matemática aqui não é simplista eu ou outra pessoa preta+instituição ou festival não é=antirracismo o meu corpo da negrura não dá autonomia a ninguém e nem é sinônimo de uma resposta pronta a uma culpa branca contemplativa que não se move para além de se autorreconhecer branco classe média privilegiado
&
ponto
final
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