por Fernando de Proença
“Viúva, Porém Honesta”. Fotos de Sergio Silvestre. |
A subserviência não veio trabalhar na montagem do Grupo Magiluth de “Viúva, Porém Honesta”, a tal farsa irresponsável de Nelson . Tudo é tocado por um senso de liberdade e autonomia pelos criadores do trabalho, tudo é de um frescor e de uma juventude que não tem a ver com ser jovem no cronômetro.
A peça é um estado de espírito. É um teatro do jeito que eles gostam de fazer teatro. E me parece que eles gostam muito de fazer teatro.
Tudo acontece às claras, tudo releva a nudez: do torço dos homens, do jogo, da cena. Nudezes.
Em um jogo vivo (até parece futebol) e cheio de testosterona e tesão, a peça vai se construindo com possibilidades (muitas!) de apreciação. O público pode ter diferentes olhares e construir, em tempo real, todo tipo de aproximação com os atores e com a encenação – uma construção que se confunde com as vidas, todas ali naquele TEUNI em Curitiba, tudo coexistindo e colocando massa corpórea no espaço, movendo o ar.
Aerados.
Os personagens do Nelson e do Magiluth estão todos alí (Ivonete, Madame CriCri, as tias, …), circulando entre os atores em um ritmo tão frenético e bagunçado quanto articulado e claro. Os atores brincam a sério, como uma criança faz.
Um encontro real acontece no meio do caminho, quando um encontrador e o outro encontrador caminham para se encontrarem. Isso acontece na relação de quem assiste ao trabalho. Todos precisam estar atentos porque tudo se move, porque tudo na vida é movimento.
As perguntas que a encenação faz para si própria revelam um tabuleiro cheios de respostas. E perguntas: Como trabalhar com um texto rocambolesco agora, hoje? Como jogar o jogo realmente, sem ponderações e economias? Como a plateia olhará? Como os atores olharão para a plateia? Como os objetos de cena se integrarão e ganharão lógica dentro da lógica da encenação?
O contato de quem está no gramado, no palco, no ringue e de quem está na arquibancada ou espremido pra ver um show de rock, ou em casa (com o quarto se bagunçando) passa por infinitas direções, escolhe todas elas e segue. Como a vida.
A encenação soma e mistura.
A proposta aponta um rigor de execução tão direta e solar que dançar a famosa Locomia com leques, evocar um estado de espíríto Greetchen ou comer Ruffles quando um dos personagens fala o clássico Batata! Do Nelson, se faz coerente e rigoroso, está tudo previsto no jogo. Não são coincidências nem são redundâncias.
E terminar esse texto pelo começo da peça , quando os atores/personagens se apresentam em ações com a voz da La Lupe, cantora cubana, cantando Puro Teatro (que antes cantou também essa para Almodòvar em Mulheres a beira de um ataque de Nervos), diz tudo sobre a encenação. A apresentação está feita e as expectativas são as da própria encenação, ela nos aponta as possibilidades. E com o verso: “Tu drama no es necesario, Ya conozco ese teatro”, os criadores informam ao público o que vem pela frente e tudo começa a se ligar. Tudo se completa, tudo é direto e todos jogamos o jogo. Da vida. E lá, abraçados com o Nelson, O drama não se faz necessário.