Entrevista com Idylla Silmarovi e João Maria Kaisen, da Academia Transliterária (Belo Horizonte).
– por Clóvis Domingos e Luciana Romagnolli, com a colaboração de Mário Rosa-
Crédito: SAL Inverno Cultural
Contra qualquer forma de censura e silenciamento das manifestações artísticas, nós, como críticos e pesquisadores da cena contemporânea, nos colocamos ao lado dos artistas e coletivos que atualmente são ameaçados em suas possibilidades de expressão artística, política, social, sexual e até mesmo existencial, e reiteramos nossa aposta na arte como potência disruptiva e dissidente.
A proibição da performance “Coroação a Nossa Senhora das Travestis” da Academia Transliterária, que seria realizada na última edição da Virada Cultural de Belo Horizonte, nos motivou a realizar uma conversa com os integrantes Idylla Silmarovi e João Maria Kaisen, afim de conhecermos um pouco mais das ações do coletivo, bem como se deu a referida interdição feita pelo prefeito, a partir das pressões advindas de movimentos cristãos conservadores e de interesses partidários de alguns políticos.
Na entrevista que segue, se destacam as possibilidades da arte como campo desestabilizador das tradições políticas, religiosas e educacionais que ainda insistem em violentar os corpos e culturas que escapam às ordens do controle e da moral vigentes.
Como e por quem é composta a Academia TransLiterária e quais são suas ações principais em Belo Horizonte, atualmente?
Primeiramente gostaríamos de agradecer ao Horizonte da Cena a pauta cedida a nós. É muito bom poder contar com agentes da cultura tão sérios e engajados no ofício da crítica em arte. A Academia TransLiterária é um coletivo formado por artistas trans/travestis e cisgêneras aliadas à pauta (da Cultura Travesti e Trans). Nós investigamos, difundimos e protagonizamos a arte e cultura trans/travestis através de estratégias como: sarau de poesia, concurso literário, ateliê aberto, criação de performances, oficinas formativas em artes e realização de palestras e seminários nas áreas de Arte e Direitos Humanos.
Gostaríamos de saber sobre a importância dos processos formativos na trajetória desse coletivo. Sabemos da iniciativa primeira de um pré-vestibular e do incentivo à profissionalização e à luta por frentes de trabalho. Como ainda hoje essa questão aparece nas ações, reivindicações, posicionamentos políticos da Academia? E na discussão sobre representatividade e representação?
A Academia surge como um dos braços do TransVest – curso pré-vestibular destinado às pessoas trans/travestis. Com o tempo fomos nos desvinculando da gestão do coletivo da ONG, por compreender que construímos um espaço de pensar e praticar empregabilidade e formação em outro viés, a princípio não institucionalizado e sem necessidade de vínculo ou desejo com a vivência universitária. Passamos a compreender, nesse período, que o que nos move é a compreensão de que corpos trans/travestis possuem sua própria cultura e estéticas, e passamos a nos interessar por essa investigação no campo das artes. Aí está também o nosso maior interesse e reivindicação política: o de corpos trans/travestis acessarem o mercado das artes enquanto fazedores, pesquisadores, pensadores, atores e atrizes, intelectuais, diretores, dramaturgues, poetas, etc.
Sobre o debate em relação à representatividade e representação percebemos que caminhamos por três momentos, sendo o primeiro quando surge em São Paulo o manifesto contra o transfake. Com o manifesto tivemos uma comoção à nível nacional sobre o debate das ausências dos corpos trans/travestis em lugares de poder nas artes e sobre a reprodução cis-temática de pessoas cisgêneras sentadas à plateia e também atuando, contando histórias sobre pessoas trans/travestis, deixando esses corpos mais uma vez à margem.
O segundo momento vem quando acontece a temporada de “Gisberta” no CCBB-BH que mobilizou diversos artistas trans/travestis de Belo Horizonte, com apoio de outres que vieram de outros estados do país criando a rede MONART – Movimento Nacional de Artistas Trans/Travestis. Nesse momento brigávamos por ética e coerência no âmbito das representatividades, no sentido de não falarem dos nossos corpos sem nossos corpos estarem presentes. À princípio isso não se difere do primeiro momento anteriormente citado, senão pelo fato de que foi aberto espaço para esse debate com os coletivos de artistas da cidade Belo Horizonte que passaram a pensar em suas políticas e fazeres, objetivando a inserção da nossa população em seus coletivos e montagens. (Vale ressaltar que esse movimento já acontecia antes mesmo desse momento, mas de forma muito tímida).
O terceiro momento é o que percebemos acontecer agora, em que os coletivos já sabem da existência de artistas trans/travestis, já ouviram ou conhecem nossos trabalhos, e podem ou não nos inserir nos espaços de poder. Notamos que para agora acessar os mercados das artes não basta apenas que seja artista trans, mas é exigido pelo mercado uma certa profissionalização – o que por muitas vezes acaba rebatendo em processos de pensamento colonizador do que é um bom artista, uma boa obra de arte, um bom modo de fazer artístico. Entretanto, surge junto a isso o que chamamos de “broche”, ou seja, quando coletivos, eventos, festivais e afins convidam apenas aquele determinado artista como alguém para validar seu “rolê” como “transfriendly”, sem a devida valorização profissional desses, incluindo obviamente a falta de remuneração na grande maioria dos convites, ainda ‘pela causa’, ‘pela visibilidade’.
Contudo percebemos a importância de pensarmos a formação das artistas trans/travestis para a inserção no mercado nas artes e, muitas vezes, nos deparamos com situações de tamanha vulnerabilidade daquela artista que chega até nós com um trabalho firme, de alto nível estético e de linguagem, trazendo a força da sua cultura e da sua matriz, mas que não consegue acessar os espaços de poder das artes por não ter tido acesso à formação, seja como artista, seja da educação básica. Vale ressaltar que no Brasil a taxa de evasão escolar entre pessoas trans/travestis é altíssima, estima-se que noventa por cento da população não concluiu o ensino médio.
Nesse sentido, acreditamos na importância de descolonizar os padrões de valorização do que é ser um bom artista, destruindo expectativas normativas para ir construindo outros espaços, que dessa vez caibam nossos corpos, que de fato pertencemos. Assim começa um novo movimento em Belo Horizonte, que talvez poderia ser um quarto período: o de artistas trans/travestis construírem seus próprios espaços e inserir a si mesmas em um circuito próprio das artes, aliades a outros corpos subalternizados, marginais. Em 2019, por exemplo, temos a primeira edição do Festival TransViva e da Festa Galla, idealizados e produzidos por artistas trans/travestis, também a exposição Bajubá em Movimento que teve duas edições e contou com 20 artistas trans, sob curadoria também trans, e outros projetos nos quais começamos a aparecer hackeando espaços de poder, empreendendo, empregando, agora sim como protagonistas das próprias histórias.
Nós, falantes, somos efeito de uma língua estruturada de maneira patriarcal, racista, binária e cisheteronormativa. Ou seja, os problemas vão muito além da demanda pela marcação de gênero no artigo, por exemplo. Como tem sido a experiência de trabalhar com a linguagem para transformar essas estruturas?
Esse processo tem justamente a ver com o que já foi citado sobre descolonizar os nossos modos de pensar arte – e nesse caso, vida. Toda essa linguagem vem como processo de colonização – entende-se normatização, genocídio e apagamento de determinados corpos, como por exemplo: corpos trans/travestis, indígenas, negros. Precisamos transformar a linguagem, mas não apenas a falada, nela encontramos as questões dos artigos, dos pronomes, sempre reflexo da misoginia, do patriarcado, do binarismo cisheterobranconormativo, hegemônico. Precisamos começar a refletir sobre outras linguagens também, a dos corpos, a das artes. Vivemos em uma sociedade repleta de imagens, seja no âmbito tanto online quanto analógico. Precisamos descolonizar nosso imaginário, nossa estética, nosso pensamento e sobretudo nossos corpos. Aí sim a linguagem enquanto língua será uma real possibilidade. Quem denominou as coisas como estão agora chegou aqui há pouco tempo – 500 anos, e tentou dizimar o que já existia. Assim, esses artigos e pronomes também são reflexo desse primeiro genocídio. É muito importante lutarmos pelo direito de usar o pronome que nos interessa em nossas individualidades, ter nosso gênero, nosso nome, nosso banheiro respeitado e todas essas lutas são parte de uma briga anti-colonial, que instaura uma biologia que nos obriga a ser o que não somos, que nos obriga a enquadrar num modo de mercado que não cabemos, que modula e define nossos corpos à sua vontade, desde o nascimento. A isso dizemos constantemente não. Sem contar aqueles corpos que biologicamente também são invisibilizados, excluídos, como se fossem uma doença, como se não existissem, mas existem, e biologicamente já questionam todo o padrão: os corpos intersexo. Nossa luta é para sermos donos de nós mesmos e sermos respeitades em nossa linguagem, desejo, pensamento e existência.
O que as perspectivas trans alteram de mais significativo nas relações entre linguagem e corpo como estão postas hoje na norma social?
Acho que as “perspectivas trans”, nossos modos de vida, alteram principalmente no que diz respeito a desestabilizar padrões impostos. Desestabilizamos leis que determinam que tal coisa te faz homem, ou te faz mulher, desestabilizamos até mesmo a necessidade de ser homem ou mulher. Desestabilizamos a língua portuguesa, desestabilizamos os banheiros masculinos que só tem mictório, desestabilizamos o público do teatro burguês que paga programas com travestis, mas se recusa a pagar ingresso para ver essa mesma travesti em um solo. Desestabilizamos à igreja cristã, desestabilizamos até mesmo as tradições que recebem nossos corpos atuando em normas não-biológicas, desestabilizamos a medicina, a biologia, desestabilizamos os hormônios e as tecnologias. Quando se tem um modo próprio de ver e de estar no mundo estamos falando de cultura. Não há colaboração mais rica e potente do que a cultural.
Está em discussão na relação dos movimentos identitários com a arte a escolha por um movimento de denúncia de performar/representar a violência e um movimento de ampliação do imaginário pela fabulação de outras possibilidades de formas de vida. Como vocês se situam nesse sentido?
Uma coisa não necessariamente se difere da outra. Acho que está no âmbito da escolha estética. Dentro da Academia TransLiterária caminhamos pelos dois lugares. Muitos dos nossos escritos dizem dos lugares de violência sofridos, mas apontamos também para outro caminho. Acreditamos que no nosso caso, já que temos o “corpo em trincheira”, essa ampliação do imaginário não deixa de lado o movimento de denúncia, caminhamos as duas coisas lado a lado. Contudo, buscamos no nosso fazer estratégias de alegria, pois cada vez que nos encontramos sabemos que talvez um de nós poderá não voltar. Vivemos no país que mais mata pessoas trans/travestis no mundo. Os índices que existem sobre nossa população são os de violência, abandono familiar, evasão escolar etc. Tentamos mudar um pouco o jogo e caminharmos para a poesia da vida, da alegria de sermos quem somos, “a alegria é a prova dos nove”, mas a performance da violência também está em nós o tempo todo; antes, durante e depois de qualquer apresentação, evento ou encontro, pelo simples fato de serem esses os corpos presentes e atuantes.
A censura sofrida pela Academia TransLiterária na Virada Cultural encontrou como justificativa a ofensa à fé cristã, como tem sido recorrente nesse momento de uso político da religião no país para justificar crimes de ódio. Como vocês avaliam o embate entre os discursos supostamente religiosos e a luta crescente pelos direitos civis e políticos de corpos que historicamente foram marginalizados, nesse nosso contexto?
Essa é uma questão muito complexa, por se tratar de uma questão de repetição histórica. As religiões de matriz judaico-cristã, aí pegando como base a Igreja Católica, é uma das principais detentoras de poder e mantenedora dos discursos hegemônicos. Se pensamos que essa religião vem para esta terra com o objetivo de catequizar, servindo como “propaganda” de um regime colonizador de genocídio e exploração e que esse regime ainda se mantém vivo, qual poder de fato o discurso dela tem? Quem a mantém de pé?
Agora vemos por exemplo a força neo-pentecostal e todo o espaço que essa força tem dentro dos congressos, câmaras e senados. Quando pensamos que chamamos uma tríade do poder público de “bancada da Bala, da Bíblia e do Boi” em quê esse sistema se difere entre si? Acreditamos que estamos em meio a um jogo de poderes e estamos brigando por todos os lados. E no meio dessa guerra nós estamos morrendo, dizemos nós num sentido ampliado. Mas a questão transcende a própria ideia de Igreja. Porque a questão é poder. Vínhamos num movimento, que apesar dos pesares não tirou ninguém dos seus lugares de privilégio, mas possibilitou acesso a outros corpos. Todo esse movimento acontecia em grande parte na América Latina. Assim como nos anos 60 e 70 (nas operações Condor e das ditaduras), estamos vivendo uma tentativa de “endireitamento latino americano” e a propaganda disso novamente é a tradição familiar, os valores cristãos, que de cristianismo mesmo não tem nada a ver. “E a palavra amor, cadê?” A questão que está em jogo é que quem detém os privilégios não quer perder e deixar que outros também tenham acessos. Daí vamos na contracorrente, porque o alvo está apontando para os nossos corpos.
Como é a abordagem da religião na performance “Coroação a Nossa Senhora das Travestis”?
Foto: Babi Macedo
A performance “Coroação da Nossa Senhora das Travestis” não trata de religião. Ela foi criada quando uma das performers do coletivo se enrolou numa bandeira trans enorme e estava com um arco de flores de plástico na cabeça. Quando vimos essa imagem achamos de uma beleza tão grande que nos parecia algo sagrado. Foi aí que tivemos a ideia de coroar várias travestis da cidade, como modo de celebrar a existência delas – que tem como expectativa de vida os 35 anos, numa performance solene, repleta de afetos e desejos de vida longa à essa senhora coroada. Daí nos apropriamos da ideia de coroação e de alguns símbolos, mas deixamos na sinopse e ao longo da performance bem evidente que não se trata da “Nossa Senhora, Sua Senhora, mas da nossa senhora, a senhora das travestis”. A partir daí criamos uma sequência de ações, um cortejo, no qual andaríamos com essa senhora pela cidade, um texto de abertura explicando de qual senhora se trata, a coroação que é vesti-la com a bandeira trans e colocar uma coroa de plástico na cabeça, presenteá-la com bijuterias, sapatos de salto, dentre outros objetos, e distribuímos a oração, escrita no dialeto utilizado pela comunidade LGBTIA+, na qual a reconhecemos como senhora e pedimos sua proteção, fazendo analogia da senhora mulher trans/travesti coroada à bandeira, que para nós representa nossa luta. Depois ela dá a sua “benção final” que é uma apresentação solo dessa travesti coroada, que pode ser uma música, um “bate-cabelo”, uma dublagem, um show, uma poesia, vai depender da expressão artística que para ela for a mais interessante. Na Virada Cultural seria coroada a sexta travesti desde que criamos a performance, e o desejo é que todas do coletivo tenham sua vez de celebrar a vida e brilhar em seu solo.
A performance já havia sido apresentada antes no FIT-BH. O que teria motivado a censura dessa vez na Virada Cultural? Teria a ver com o fato do trabalho artístico ocupar o passeio em frente de uma igreja?
A performance já aconteceu em diversos circuitos incluindo o FIT-BH e não tivemos nenhum problema. Inclusive no Festival de Inverno da cidade de Santo Antônio do Leite saímos da porta de uma Igreja. Acreditamos que essa censura tenha alguns motivos. O primeiro é: quem está na presidência do Brasil? Esse fato pode parecer demasiado macro-político, mas se reflete numa histeria conservadora, uma vez que quem está no poder é uma pessoa que de fato colabora com esse tipo de discurso e incita o ódio contra corpos – nesse caso, trans/travestis. A Arquidiocese de Belo Horizonte dessa vez se manifestou contrária à nossa apresentação, fato. E, ainda que num outro momento tenhamos apresentado via Prefeitura Municipal, no FIT-BH, e apesar de esse ser um evento grande e de fundamental importância para a cidade de Belo Horizonte e para o Estado de MG, é um evento que atinge determinada camada da população, diferentemente da Virada Cultural, que se trata de um evento de maior alcance, tanto da mídia, quanto do público.
Ocupar o passeio da Igreja para nós é um fator pequeno mediante a tudo o que foi apresentado, inclusive poderíamos fazer o cortejo saindo de qualquer outro lugar, mas sim sair da porta da Igreja tem valor. Afinal, não somos dignas de frequentar a Igreja? E o que estão fazendo a respeito da intolerância à Tradição de Matriz Indígena e Africana? É realmente coerente se importar com o fato de pessoas trans e travestis estarem na porta de uma Igreja, enquanto sangue indígena continua sendo derramando, enquanto mães e pais de santo têm seu Ilê invadido, seus atabaques apreendidos? De que intolerância estamos falando? Será mesmo que isso tudo que estamos falando é sobre religião?
Vocês tiveram algum apoio de artistas, entidades e políticos? Caso sim, como isso se deu? Há perspectiva de apresentação do trabalho em Belo Horizonte?
Nós recebemos muito apoio de diversos artistas que compuseram a programação da Virada Cultural, e foi incrível ver a potência que temos, que somos, o que podemos transformar quando somamos a intersecção das forças. Houve manifestações favoráveis ao coletivo por parte de artistas locais e de outros estados, público da Virada Cultural, representantes do poder público, membros de conselho de Direitos Humanos, Fórum das Juventudes da grande BH e região metropolitana, Cooperativa Marginal, Conselho Municipal de Cultura, Instituto Periférico, Gabinetona, Fórum de Segurança Alimentar dos Povos Tradicionais de Matriz Africana, Mães pela Diversidade etc. Foram incontáveis mensagens de apoio e solidariedade de pessoas via nossas redes sociais, também de alguns representantes religiosos da Igreja Católica e Evangélica.
Em relação aos artistas apoiadores, muitos nos convidaram a ocupar o palco com eles, mas consideramos como uma estratégia melhor, até mesmo para frear a disseminação de discursos de ódio e ameaças de violência, agradecer e dizer não, não faremos dessa vez. A essas artistas enviamos a oração da nossa senhora das travestis e pedimos que lessem em suas apresentações e nos enviassem o vídeo. E assim se deu, assim fomos bombardeados de afeto, de força da rede, nossas redes sociais não paravam de exibir vídeos e mais vídeos de artistas lendo a oração. Por fim, temos o desejo, mas ainda não temos previsão de apresentar a performance na cidade.
Como foi até agora o diálogo com instâncias institucionais da prefeitura e o que o cancelamento da performance, da forma como foi realizada pelo prefeito Kalil (pelo twitter, no tom moralista, respondendo a um grupo específico), aponta?
Imagem da Internet
Quando começaram a sair os discursos de ódio e os pedidos de cancelamento por parte dos civis nós estávamos em contato com a produção da Virada Cultural pelo Instituto Periférico, negociando a mudança do espaço de apresentação, visando nossa segurança e a realização da performance. Contudo quando saiu o texto da Arquidiocese de Belo Horizonte exigindo nosso cancelamento, recebemos uma ligação de uma reunião urgente com a Fundação e a Secretaria Municipal de Cultura. Nessa reunião fomos informados da censura da nossa performance e de que a Fundação e a Secretaria não poderiam fazer nada em relação a isso, ainda que tivéssemos sido aprovadas por um edital que recebeu 1.554 inscrições e teve 120 selecionadas, ainda que reconhecessem e valorizassem o trabalho que fazemos nesses três anos de Academia TransLiterária, já que foi uma ordem vinda diretamente do prefeito Alexandre Kalil, pelo Twitter.
Acreditamos que esse modo de censura aponta um “velho novo” processo que demonstra o poder que a Igreja Católica ainda possui. Apesar de estarmos em um momento de força das igrejas evangélicas, notamos que quando a Igreja Católica se manifesta não há muito o que fazer. O prefeito obedece. Acreditamos também que isso tem a ver com um certo rechaçamento em relação aos posicionamentos do prefeito na Parada LGBT que havia acontecido na semana anterior. Mas sobretudo demonstra a força do pensamento de uma elite conservadora. Acreditamos também que apesar de tudo isso podemos ver a força da luta, de quem não anda só, de quem é profissional e tem aliados.
A Academia TransLiterária está com novos projetos na cidade?
Sim. Estamos iniciando agora no mês de agosto o projeto Atenção!, que foi contemplado com recursos do Fundo Municipal de Incentivo à Cultura. Nesse projeto, abrimos bolsas de estudos exclusivas para pessoas trans/travestis usuárias do Hospital Eduardo de Menezes – Ambulatório Trans Anyky Lima, para montagem de um espetáculo teatral que estreia em novembro, no aniversário do ambulatório. Estamos nos capacitando em empreendedorismo, numa parceria com o Mais Favela, projeto de empregabilidade viabilizado pelo Equi ONG, e já temos agenda no Filme de Rua, Bienal do Livro de Contagem, Janela de Dramaturgia, Cine Clube Aranha e II FLIR.
Abraços, estamos à disposição.
Idylla Silmarovi e João Maria Kaisen.